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Domingo, Maio 19, 2024

Dignificação humana ao nível da saúde mental

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Pedro Nogueira Simões
Pedro Nogueira Simões
Advogado, Psicólogo e Investigador Universitário

Quando o consagrado filósofo alemão Arthur Schopenhauer argumentou que o maior erro que um homem pode cometer é sacrificar a sua saúde a qualquer outra vantagem, o mesmo, garantidamente teria razão; esse é o pressuposto máximo da condição humana, o qual apenas com essa premissa pode alcançar outros patamares no seu quotidiano.

No entanto, nem sempre tal entendimento foi unânime. Assim como o modo como o tratamento a utilizar em tempos passados, muito comprometia tal dignidade. Podemos, aliás, afirmar que tal movimento de mudança  começou  em Paris, em 1792. Sob os estudos do Dr. Philippe Pinel, com o paradigma de se abster de recorrer à violência e à abertura para uma visão de cuidado e melhoria de condições – a título de exemplo, o mesmo ordenou que todas as instalações fossem limpas e os pacientes tivessem acesso à luz solar.

Mas voltando à realidade portuguesa, tal preocupação de melhoria mantém-se, com o surgimento da Lei de Saúde Mental, aprovada pela Lei n.º 35/2023, de 21 de julho, que visa o fim dos casos “impensáveis” a nível dos direitos humanos.

Assim no presente mês, observou-se alterações à antiga lei – já existia há cerca de 20 anos – acabando a mesma com a possibilidade de prolongamento automático do internamento de inimputáveis e à continuação da admissão de internamento compulsivo, porém como último recurso.

Aliás, a própria Organização Mundial de Saúde é clara quando defende que a saúde mental não é a simples ausência de doença, mas sim um estado de bem-estar em que cada indivíduo realiza o seu próprio potencial, consegue lidar com os desafios normais da vida, consegue trabalhar de forma produtiva e frutífera e é capaz de contribuir para a sua comunidade.

E a título de exemplo, até a própria Convenção dos Direitos de Pessoas com Deficiência levou os vários países a repensar as suas leis, e a estipular direitos que até aí não estavam acautelados. Ou seja, também estas pessoas podem contribuir para a sua comunidade, quando exercem o seu direito de votar. Situação essa que agora é possível, mas até então não lhes era reconhecida.

Quanto ao nível do internamento compulsivo, apesar de ser ainda admitido, novas regras e estipulações são evidenciadas e tal mecanismo apenas é utilizado como último recurso e como forma de desenvolvimento de prestação na comunidade próximo das pessoas e com terapia de residência e uma contínua avaliação às suas necessidades – acompanhada por um grupo de trabalho composto pelo Ministério da Saúde, do Trabalho, da Justiça e as unidades forenses.

Nesta sequência, surge a figura do tratamento involuntário, determinada em casos de recusa do tratamento medicamente prescrito – só se verificando a exceção, quando um determinado indivíduo se coloca em situações de perigo ou terceiros –, tendo como finalidade terapêutica a recuperação integral das pessoas, mediante intervenção terapêutica e psicossocial. Tal tratamento será assegurado pelos serviços locais de saúde mental e/ou equipas comunitárias de saúde mental.

Prevê-se assim que a pessoa com necessidade de cuidados de saúde mental seja representada, no exercício dos mesmos, pelo acompanhante – regime do maior acompanhado, aprovado em 2018 – ou digamos, por uma pessoa de confiança.
Contudo, uma das significativas mudanças deve-se ao fim do prolongamento automático do internamento de inimputáveis, que digamos mais se equiparava em muitos casos a uma prisão perpétua, ou seja, é completamente contrário aos direitos humanos as medidas de segurança destes doentes prorrogadas sucessivamente – cuja revogação do n.º3 do artigo 92.º do Código Penal, que possibilita o cessar de tais medidas de segurança de internamento que, à data, já tenham ultrapassado a duração máxima da pena prevista para o tipo de crime.



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