Às vezes não temos a noção da dimensão afetiva que são para nós os avós; quando, na verdade, somos para eles a única herança que habita o seu coração. Somos aqueles seres que devolvem, quase sempre, um outro tempo aos seus braços. É nesse embalo de barco em mar sereno, que alguma saudade se desfaz. Voltam a ter no colo os seus próprios filhos. E isto não é coisa pouca não, é renascer numa fase da vida em que o horizonte se estreita.
Os avós são o pilar da nossa infância.
A realidade que hoje vivemos, um corre-corre desenfreado, parece ser a principal causa de não estarmos com os nossos avós o tempo que gostaríamos, contudo outras razões mais dolorosas – penso eu, é o desapego. Não visitamos mais a casa da infância de portões verdes e heras a rodear as janelas e portas que outrora se escancaravam, felizes, à nossa chegada. Aqui corríamos atrás do sol nas tardes de café com leite e pão com manteiga. Tempos bem-aventurados agarrados ao avental às bolinhas da avó. Às histórias do avô debaixo da cerejeira quando a escola terminava – quantos monstros e princesas povoavam as nossas noites! E gostávamos.
Tempos bem-aventurados no parque da cidade a dar comer aos patos ou apanhar castanha-da-índia que guardávamos nos bolsos do bibe. Tempos em que o avô era a mão gigante que nos ajeitava o chapéu e o seu peito um casulo quente. Tempo de correrias e joelhos esfolados que a avó beijava: “Já passou”.
E hoje, adultos, donos da própria vida sentimos que não passámos tempo suficiente com os nossos avós. Que as memórias se desvanecem e outros braços tomam conta de nós. Onde nos perdemos desses avós adoçados, em que vielas os deixámos?!
Os avós fazem-nos falta em todos os momentos e a lembrança deles apazigua a nossa memória. É um legado que sobrevive a todas as gerações.
É inegável a cumplicidade que une, avós e netos, quando os seus olhares se cruzam e do bolso do casaco avantajado, esvoaçam guloseimas às escondidas do olhar da mãe. Há nos avós uma certa magia que nos mima incondicionalmente.
Seremos nós, vítimas desta sociedade que nos engole os sentimentos? Ou criamos barreiras à infância que nos habita…bem sei que crescer nos afasta dos laços tecidos na infância e retomá-los pode ser tão doloroso como crescer.
E talvez por isso beijamos e abraçamos tão pouco os nossos avós.

Professora e Escritora