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Sábado, Julho 12, 2025

Maria Luís Albuquerque apresenta: “Quem Quer Ser Milionário?” — Por Amadeu Ricardo

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E eis que regressa ao palco europeu, com ar de gestora de fundos de capital de risco e alma de vendedora de raspadinhas de luxo, a nossa muito excelsa Comissária Maria Luís Albuquerque. Desta vez, não para nos tirar o 13.º mês, mas para nos prometer a Dinamarca… com o nosso próprio dinheiro.

Naquilo que parece mais uma série de comédia negra da Comissão Europeia — em que todos os episódios começam com “incentivos fiscais” e acabam com “cortes sociais” — Maria Luís quer reinventar a Segurança Social à la mercado de capitais. E fá-lo com a subtileza de um elefante num centro de dia:

“Porque é que os pensionistas portugueses não hão-de querer ter o nível de pensões dos dinamarqueses?”

Boa pergunta, Maria Luís Albuquerque.
Talvez porque os dinamarqueses vivem num país que não entregou as pensões a banqueiros e brokers de Wall Street. Talvez porque lá o Estado não vende ilusões de futuro dourado, embaladas em fundos de investimento com apps “low cost”. Ou talvez porque, ao contrário de si, eles não confundem segurança social com casino online.

O plano é simples: transformar o dinheiro suado de quem trabalha num novo “jackpot europeu” — com a promessa mágica de que, se jogarmos bem, talvez tenhamos sorte na reforma. Mas isto não é uma reforma. É uma burla institucional com assinatura de Bruxelas e sotaque da NATO.

Mais: Maria Luís sabe perfeitamente que a Segurança Social não dá prejuízo. Aliás, é precisamente por isso que a quer meter no jogo.

O mito do Adamastor da Segurança Social

Anterior a 2006, a Segurança Social funcionava como devia: um sistema contributivo, equilibrado, alimentado pelas contribuições dos trabalhadores e das empresas. Dava lucro. Sim, leu bem: lucro. Entre as receitas e despesas, sobravam milhares de milhões de euros. A Caixa Nacional de Pensões, que processa as reformas da função pública, era um universo à parte — e o seu financiamento vinha diretamente do Orçamento do Estado.

Mas depois, alguém teve a brilhante ideia de juntar tudo no mesmo saco. Resultado? A Segurança Social herdou mais de um milhão de pensões da função pública, sem receber as devidas contrapartidas. Passou a pagar contas que não eram suas — e ainda hoje dizem por aí que “o sistema está falido”.

Não está falido. Está rapinado.

É como se tivéssemos uma mercearia saudável, com as contas em dia, e de repente essa mercearia vai ser obrigada a sustentar um hipermercado falido — sem receber nem um cêntimo a mais. E depois, claro, culpam a mercearia por não ter “sustentabilidade”.

Maria Luís sabe disto tudo. Sabe que o modelo actual da Segurança Social é sustentável se o Estado cumprir a sua parte. Mas em vez disso, prefere fazer de conta que o problema é “ideológico” e que a solução passa por empurrar os cidadãos para o mercado de capitais. A mesma lógica que levou ao colapso de pensões privadas noutros países. Mas isso não interessa — desde que os bancos tenham mais produtos para vender.

Quem lucra com o novo “milionário”?

Não é o povo, de certeza.
Não é o trabalhador que recebe 900€ por mês e ouve, com ar estupefacto, que devia “diversificar a sua carteira de investimento”.
Não é o reformado que mal consegue pagar a conta da farmácia e agora é empurrado para aplicações de risco em vez de ter um sistema público justo.
Mas há sempre quem ganhe: os bancos, as seguradoras, os fundos de pensões privados, consultoras, plataformas financeiras. Todos a esfregar as mãos com esta nova mina de ouro chamada “poupança dos pobres”.

É preciso ter um cinismo olímpica — ou uma fidelidade canina ao capital financeiro — para, com este passado de destruição orçamental e corte social, vir agora vender “oportunidades de investimento” como se estivéssemos todos em Wall Street.

Maria Luís Albuquerque não está a defender os pensionistas. Está a defender um negócio.
O que ela propõe não é a modernização da Segurança Social. É sabotá-la por dentro, esvaziá-la do sentido, desviar os fluxos monetários para o mercado privado, e depois, quando a coisa estourar, vir dizer: “fizemos tudo o que podíamos”.
É a cartilha do costume: transformar os direitos em produtos financeiros. E a cidadania em clientes endividados.

Pensar não custa. Mas podes evitar que te roubem a reforma.

Não é necessário ser Doutor em economia. Basta olhar para os números com honestidade:
A Segurança Social dava saldo positivo até herdar as pensões da função pública sem a respectiva compensação.
A maioria das pensões pagas são com base nas contribuições dos trabalhadores e das empresas — não do Estado.

O sistema tem solução se for gerido com verdade, responsabilidade e justiça intergeracional.
Mas isso não interessa a quem vê a reforma como uma oportunidade de negócio.

A Maria Luís Albuquerque quer joguemos no “Quem Quer Ser Milionário?”.
Pois bem: não jogues.
Exige um Estado que proteja, não um mercado que explore.

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