Há perguntas que só surgem quando o mundo à nossa volta falha.
Quando a confiança racha, as histórias se confundem e o humano parece tão distante que quase se perde de vista. Nesses momentos procurei uma resposta que não fosse fácil, nem abstrata, nem feita de promessas vazias. Quis algo que resistisse ao medo, ao silêncio duro, às narrativas distorcidas. Algo que não dependesse de fé, ideologia ou boas intenções. Algo humano que sobrevivesse ao pior de nós, e simples o bastante para ser real.
Depois de ver as filmagens de The Artist Is Present, de Marina Abramović, eu e uma boa amiga decidimos experimentar. Sentámo-nos em silêncio, olhos nos olhos. Sem conversa. Sem explicações. O tempo alongou-se. O corpo reagiu antes do pensamento. Dei por mim a pensar no quanto evitamos o olhar quando não sabemos o que dizer.
Fiquei depois a imaginar como seria fazer o mesmo com estranhos. Sentar-me em silêncio diante de alguém que não conheço. Sustentar o olhar sem história prévia, sem rótulo, sem defesa. Foi aí que entendi o que falha primeiro. Não é o diálogo. Não é a paz. Nem sequer o perdão. O que falha primeiro é o reconhecimento.
Há um instante breve, silencioso, quase invisível, em que deixamos de ver o outro como ameaça, rótulo ou sombra e o vemos de novo como pessoa. Só isso. Mas isso é tudo.
Este gesto não exige perdão. Não pede amor. Não romantiza nada. Não apaga conflitos nem resolve histórias mal contadas. Apenas interrompe a desumanização.

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