Ao assistir ao debate da Moção de Confiança, lembrei-me dos tempos – 1975, 1976, 1977 – em que, nos liceus (atualmente, escolas secundárias), passávamos tardes e noites em RGA’s (Reuniões Gerais de Alunos) e RGE’s (Reuniões Gerais de Escola) e onde eram debatidos assuntos de duvidoso interesse para alunos e restante comunidade escolar. Os saneamentos de reitores e professores saíram dessas históricas reuniões de 75 e 76.
A grande diferença entre esses velhos acertos de contas com o ensino do Estado Novo e ao que hoje assistimos, só varia nas condições do espaço e a (pouca) divulgação por parte da comunicação social. De resto, barulho – apupos, assobiadelas, palmas – discussões, faltas de respeito, insultos e ameaças – nomeadamente entre os apoiantes da UEC (União de Estudantes Comunistas) e MRPP (Movimento Reorganizativo do Partido do Proletariado) havia de sobra. Mas tudo decidido por suposta maioria.
Mais civilizado no Parlamento, é certo, mas com os mesmos truques que eram utilizados nesses tempos – contornar as regras para colocar o ónus no nosso adversário político. Bonito não era. E continua a não ser. Alguns de nós, amadurecemos…
Se o governo caiu, a culpa é do Primeiro – Ministro. Foi ele, só ele, quem criou a crise politica. Obviamente, os partidos da oposição não iam votar a favor de uma moção destas! Montenegro sabia, Pedro Nuno Santos sabia, toda a gente sabia. De tal modo que, dentro do Parlamento, começou a campanha eleitoral. Do PSD, com aquele serpentear retórico-político a que chamou “esforços para o governo continuar”; o PS, com a firmeza no voto contra e o Chega com a ressabiada frase “não é não “.
Luís Montenegro afirmou a sua “inocência” ao longo da semana. De uma situação que ainda ninguém percebeu, porque não foi cabalmente explicada. E se o Primeiro-Ministro nada tem a temer, devia aceitar a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito), sem “habilidades” , ao invés de avançar com a Moção de Confiança. Duvido mesmo que todos os membros deste governo tenham estado de acordo com a decisão.
Montenegro esteve mal neste processo, não o governo, apenas Montenegro. Aceitar a CPI ou demitir-se, seriam as saídas dignas. A proposta apresentada à oposição foi um “doce”, ou como se diz em futebolês, uma “abébia” , um golo na própria baliza. Neste caso, um taticismo político que pode sair-lhe mais caro do que furtar-se à CPI. Até o Iniciativa Liberal, que votou a favor, censurou a atitude do governante.
Uma coisa é certa, venceu a democracia. E as decisões foram devolvidas ao povo português.
Ao contrário das RGA’s , que citei no início, a democracia ficava muita a desejar entre aquelas turbas revolucionárias e em que as maiorias eram muito suspeitas! Não esqueçamos que, após o 25 de Abril, logo em junho, foi criada uma Comissão “ad-hoc” para controlar a imprensa, rádio, televisão, teatro e cinema. E o “Projeto Jesuíno” pretendia repor a censura, mas com outro nome. Portanto, a democracia era incipiente e tinha muito para crescer.
Agora, já cansada e madura, a democracia venceu. Como dizia José Saramago, “a idade traz-nos uma coisa boa que é uma coisa má, acalma-nos, e as tentações, mesmo quando são imperiosas, tornam-se menos urgentes.”
Não sejamos trágicos e vamos lá então resolver isto em eleições.
Jornalista