No coração de uma cidade iluminada, onde cada esquina era um palco para sorrisos e abraços, havia uma casa onde o Natal se fazia em tons de silêncio. Dentro dela, morava Maria, uma mulher de cabelos prateados que refletiam a luz tímida das velas que acendia sozinha. Era véspera de Natal, mas, para Maria, o tempo não corria em datas; corria em memórias.
A mesa, pequena e arrumada, trazia apenas um prato, um copo e um guardanapo dobrado com cuidado. Na prateleira, um presépio antigo, com figuras desgastadas pelo tempo, olhava para ela como testemunhas silenciosas de tantos natais que já não vinham.
A solidão não chegara com o inverno daquele ano; era uma velha companheira, que se instalara devagar, como o vento que entra por uma fresta e toma conta do ambiente antes que se perceba. O silêncio, porém, não era vazio — era cheio de vozes do passado. Naquele momento, Maria podia ouvir o riso dos filhos ainda crianças, o som dos sinos da igreja, o barulho de pratos sendo lavados ao final da ceia. Ela fechava os olhos e o Natal tornava-se num mosaico de tempos que não voltavam.
Do lado de fora, a neve começava a cair como se o céu quisesse cobrir o mundo com um manto de paz. Maria abriu a janela e, pela primeira vez em meses, deixou que o vento entrasse. Ele trouxe o som de uma música distante, entoada por um coro na praça. Era uma melodia doce, um convite subtil para se abrir, para lembrar que mesmo a solidão pode ser um lugar de reconexão.
Maria respirou fundo, sentiu o frio nas mãos e o calor de uma lágrima descendo pelo rosto. Naquele instante, compreendeu: o Natal não era feito apenas de companhias ou de mesas cheias. Era também um momento de ouvir a própria alma e de acender luzes internas.
Então, ela voltou para dentro, cortou uma fatia de pão e colocou-a sobre a mesa. Fez uma segunda fatia, como se a estivesse oferecendo a alguém que não estava ali, mas que, de alguma forma, habitava o seu coração. Naquele gesto simples, o vazio pareceu tornar-se menos pesado.
E, assim, Maria passou a noite, dialogando com as memórias, sentindo o pulsar de uma paz silenciosa. A solidão, por mais fria que fosse, naquele Natal, não era uma ausência — era uma forma de reencontro!
Poetisa