Se há um poema de Natal que seja um olhar sobre uma dor crónica.
A dor dos passos sobre as calçadas. Um relento nos ossos.
O vazio das janelas. As portas fechadas.
Vagueiam pelas ruas 13.000 almas. Desamparadas de tudo e todos.
Carregam estilhaços de vida em sacos de nada.
Não há abrigo nem chama
Nem abraços
Nem risos
Nem espera.
Não há casa nem retratos
Nem sopa no prato.
São almas gastas, almas sem crenças
Almas socadas em pedra fria
Perdidas entre paredes de cartão sob nesgas de céu sem azul
Almas que mordem um silêncio amiserado.
Oh, gente irmã, desenlaçada do útero da terra, do seio farto!
Onde vos morreram as primaveras? Onde vos desaconteceram os dias?
Se há um poema de Natal que seja Voz.
Denúncia.
Que seja Esperança num futuro melhor.
Há em Portugal 13.000 sem-abrigo. São estes os náufragos sobreviventes de uma tempestiva sociedade que os ignora e esquece.
Professora e Escritora