Hobbes e a necessidade do Leviatã
A sessão iniciou-se com uma questão provocadora lançada por David Erlich: “E se amanhã acordássemos sem governo? Como seria viver num mundo sem leis nem autoridade?” A interrogação gerou um silêncio reflexivo, antes de uma participante se aventurar: “Provavelmente, o caos…”
O professor sorriu e assentiu. “Exatamente! E é essa a visão de Thomas Hobbes. No seu ‘Leviatã’, ele descreve o estado de natureza como uma guerra de todos contra todos, onde a vida seria ‘solitária, pobre, sórdida, brutal e curta’. Segundo Hobbes, sem um poder central forte, não há ordem nem segurança. O medo da morte violenta leva-nos a um contrato social, em que entregamos a nossa liberdade ao soberano em troca de proteção.”
Um dos participantes interveio: “Então Hobbes defende uma monarquia absoluta?”
“Sim, mas não necessariamente hereditária,” respondeu David Erlich. “O soberano pode ser um monarca, mas também pode ser uma assembleia. O essencial é que tenha poder absoluto para garantir a paz.”
Outro aluno argumentou: “Mas isso não é um modelo perigoso? Não justifica ditaduras?”
O pedagogo acenou lentamente. “É precisamente essa a crítica que muitos fazem. Mas Hobbes acreditava que um governo forte era o preço da estabilidade. Sem ele, regressaríamos ao caos.”
Locke e o direito à rebelião
Seguiu-se John Locke, e o preletor desafiou os participantes a comparar as visões dos dois pensadores: “Se Hobbes viu a autoridade como um mal necessário, Locke foca-se nos direitos do indivíduo. Para ele, os seres humanos têm direitos naturais – vida, liberdade e propriedade – que o governo deve proteger.”
“Mas e se o governo se tornar opressor?”, perguntou uma aluna.
O cursante sorriu, antecipando a questão. “Precisamente! Locke diz que, se um governo não cumprir a sua função, os cidadãos têm o direito – e até o dever – de o derrubar. Daí a sua influência na Revolução Gloriosa de 1688 e mais tarde na Revolução Americana.“
Outro participante interveio: “Então Locke já antevia a democracia moderna?”
“De certa forma, sim,” respondeu David Erlich. “Ele defendia um governo limitado e a separação de poderes, algo que Montesquieu mais tarde desenvolveria. No entanto, Locke ainda não falava de sufrágio universal.”
Os participantes começaram a debater a relevância das ideias de Locke nos dias de hoje. “Acreditam que os governos atuais protegem os direitos individuais como Locke desejava?” A discussão intensificou-se, com alguns a apontarem para ameaças contemporâneas às liberdades civis e outros a destacarem as garantias democráticas.
Rousseau e a vontade geral
O último filósofo abordado foi Jean-Jacques Rousseau, introduzido por David Erlich com uma citação do próprio: “O homem nasce livre, mas em toda a parte está acorrentado.” Um aluno franziu o sobrolho. “Isso parece contraditório…”
O professor apoiou. “Boa observação! Rousseau acreditava que a sociedade corrompe o homem. Para ele, a liberdade só pode existir num regime onde as leis refletem a vontade geral. Não a vontade da maioria, mas sim o interesse coletivo.”
“Mas isso não pode levar ao totalitarismo? Se a vontade geral for imposta, como fica a liberdade individual?“, questionou outro aluno.
David Erlich assentiu. “Essa é uma crítica legítima. Rousseau imaginou um modelo de democracia direta, mas a interpretação da ‘vontade geral’ já serviu para justificar regimes autoritários. Daí a importância de mantermos o pensamento crítico ao ler estes filósofos.”
Houve ainda espaço para discutir a influência de Rousseau nas revoluções modernas, especialmente na Revolução Francesa. “As ideias de Rousseau inspiraram tanto democracias como governos totalitários. Mas até que ponto podemos separar as suas intenções da forma como foram usadas?” – desafiou o docente, incentivando a reflexão.
Entre a ordem e a liberdade
A sessão terminou com uma reflexão coletiva. “Depois de tudo o que discutimos,” perguntou o orientador “qual destes modelos prefeririam? O governo forte de Hobbes, o liberalismo de Locke ou a democracia direta de Rousseau?”
As opiniões dividiram-se, com alguns a defenderem a necessidade de autoridade para evitar o caos, enquanto outros enfatizavam a importância da liberdade individual. “Talvez o segredo esteja num equilíbrio entre os três”, sugeriu um participante.
David Erlich sorriu. “E talvez seja por isso que continuamos a debater estes temas séculos depois. Até à próxima sessão, onde abordaremos Karl Marx, Max Weber e Hannah Arendt, esta última, mais a fundo.”
OC/RPC
Editor Adjunto