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Terça-feira, Novembro 18, 2025

Jan Ernst Matzeliger: O homem que pôs o mundo de pé

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Morreu aos 37 anos, pobre e esquecido, mas hoje usa-se a invenção dele todos os dias da sua vida.

Em 1880, um par de sapatos custava mais do que a maioria das famílias ganhava numa semana. Não porque o couro fosse raro ou os sapateiros gananciosos, mas por causa de um passo impossível de mecanizar: o chamado “duradouro”, que fixava a parte superior de um sapato à sua sola. Era um trabalho de precisão extrema, realizado apenas por mestres artesãos, 50 pares por dia, do nascer ao pôr do sol. Eram insubstituíveis.

Dezenas de inventores tentaram criar uma máquina que o fizesse. Todos falharam. Até que surgiu um jovem imigrante negro, que mal falava inglês, mas decidiu que conseguiria.

Jan Ernst Matzeliger. Foto: Direitos Reservados

Jan Ernst Matzeliger nasceu no Suriname em 1852. Filho de um holandês e de uma mulher negra do Suriname, apaixonou-se cedo pelas engrenagens e alavancas, pelo metal que parecia ter vida própria. Aos 21 anos, chegou a Lynn, Massachusetts — a capital do sapato da América. Viu o gargalo que limitava a indústria e percebeu que ninguém acreditava que um imigrante negro pudesse resolver o problema que os maiores inventores não tinham conseguido solucionar.

Ele não pediu permissão. Começou.

Trabalhava dez horas na fábrica e depois estudava sozinho à luz de velas: inglês, desenho mecânico, engenharia avançada. Durante seis anos, construiu, testou e falhou repetidamente. Riu-se dele, desprezaram-no, fecharam-se-lhe portas. Mas ele persistiu.

Em 20 de março de 1883, o Gabinete de Patentes dos Estados Unidos concedeu a patente n.º 274.207 a Matzeliger. A sua máquina não apenas funcionava — era revolucionária. Onde 50 pares eram produzidos por dia, a sua invenção produzia 150 a 700 pares com precisão e consistência. Em poucos anos, o preço dos sapatos desceu para metade, e as famílias conseguiram, pela primeira vez, calçar os seus filhos com dignidade.

Mas Matzeliger nunca viu a glória. Para financiar a produção, teve de ceder participações aos investidores, que se tornaram milionários. Ele recebeu apenas um pagamento modesto. Continuou a trabalhar, mas o cansaço, a pobreza e a falta de cuidados médicos cobraram o seu preço. Em 1889, com 37 anos, morreu de tuberculose.

Enquanto os que lucraram com a sua invenção viveram confortavelmente, ele desapareceu da história. Durante mais de um século, o seu nome foi esquecido. Apenas em 1991 foi reconhecido pelo National Inventors Hall of Fame.

Mas o que não conseguiram apagar foi a força da sua invenção. Cada sapato produzido em massa desde então carrega a sua marca invisível. Cada passo que dá, cada par de sapatilhas ou botas que calça, existe por causa de um jovem do Suriname que se recusou a acreditar que impossível fosse impossível.

O seu nome é: Jan Ernst Matzeliger (1852–1889) — o homem que pôs o mundo de pé.

Fontes:
National Inventors Hall of Fame — Jan Ernst Matzeliger (1991)
U.S. Patent Office — Patente n.º 274.207 (20 de março de 1883)
Arquivo Histórico de Lynn, Massachusetts — Registos de Imigração
“The Forgotten Inventor: Jan Ernst Matzeliger and the Shoe Lasting Machine” — Estudos de História Industrial
Smithsonian Institution — Coleção de Inventores Afro-Americanos

Vítor Lima

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