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Quinta-feira, Maio 15, 2025

Um chefe com “falta de miolos”

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Nas redacções dos jornais encontrei gente gira e menos gira, boas e péssimas pessoas, chefes com excelente critério de chefia e de direcção, mas também gente rafeira, com entendimento ao nível de um reles soldado da Guarda Nacional Republicana do tempo de Salazar, disparando mortalmente contra Catarina Eufémia, jovem camponesa inofensiva e grávida.

De chefe criterioso, sensível e inteligente, dou como exemplo o senhor Carlos Alberto Lourenço, meu chefe de Redacção no jornal “O Primeiro de Janeiro” em 1978. Homem de estatura média, magro e sorridente, estudou em Seminário, tocava piano e foi professor da Instrução Primária antes de abraçar a carreira de jornalista.

Pela sua postura de chefe defensor de pacíficas relações, merecia o respeito de todos os jornalistas. Um dia tive a confirmação da sua grandiosa estatura!

O estirador onde eu trabalhava situava-se no extremo oposto à porta de entrada da Redacção. No Inverno, com aquela porta aberta, rapava um frio de gelar os ossos! Para evitar tal incómodo coloquei um recado no vidro da porta: “Por Favor, Feche a Porta”. Aquilo funcionou no primeiro dia. Depois, toda a gente se esquecia do recado. Pensei que se o mudasse com frequência, dizendo o mesmo, mas de modo diferente, prendia a atenção dos meus camaradas e a porta seria fechada. O esquema funcionou!

Um dia, naqueles recados de portaria, já depois de gastar muitas ideias para os embelezar, desenhei uma mulher em bikini, dizendo: “Ó filho, se fechares a porta, dou-te uma coisa”.

No dia seguinte, quando entrei ao serviço às quatro horas da tarde, tinha um recado para ir falar com o chefe de Redacção. Entrei no seu gabinete e o senhor Carlos Alberto, com o seu habitual sorriso e tom de voz baixo, perguntou-me se era eu o autor daquele desenho. Confirmei, e ele pediu-me para o retirar, explicando sem abandonar o sorriso: “durante a manhã a Redacção é visitada por alunos de várias escolas. É uma vergonha termos ali aquilo!”.

Compreendi-o, pedi-lhe desculpa pelo meu acto e retirei o desenho. O senhor Carlos Alberto tinha autoridade para o retirar, rasgá-lo e deitá-lo ao lixo. Mas não foi assim que ele procedeu. Entendeu, e bem, que aquele “boneco” teria de ser retirado por quem o colocou!

Substitui-o por outro recado com a frase: “Feche a Porta, S. P. F“. Toda a gente me veio perguntar o que significava aquela sigla… e ficavam a saber: “Feche a Porta, Seu Pilho da Futa”.

O contrário desta postura decente demonstrada pelo senhor Carlos Alberto no jornal “O Primeiro de Janeiro”, é o caso seguinte que me aconteceu no “Jornal de Notícias”, em tempo de obras na baixa do Porto para a instalação da linha do Metropolitano.

O director pediu-me um desenho para ilustrar uma notícia referindo problemas detectados nas obras do Metro e que configuravam, já, queixas em Bruxelas. Recordo que um dos problemas referia a morte de uma senhora residente na zona de Campanhã, “engolida” por uma cratera que, inopinadamente, se abriu debaixo de si, no seu quintal, em resultado da trepidação das terras na abertura do túnel para a linha.

O “boneco” com a legenda original e que foi entregue ao diretor.



O título era este: “Metro do Porto «embrulhado» por queixas em Bruxelas”. Recorri a um trocadilho e brinquei com as unidades de medida “metro” e “quilómetro”. Desenhei um engraxador (então ainda figura típica da baixa portuense) dizendo “Tão cedo não temos Metro… os problemas são aos quilómetros!”. O chefe de redacção, estupidamente, mutilou a legenda, retirando-lhe a possível piada que ela pudesse ter!…

A legenda que saiu, depois de passar pelo censor.

Foi das censuras mais estúpidas que senti sobre o meu trabalho!… Desta vez nem imagino onde estaria o motivo da censura!… Provavelmente só se encontrava na mioleira do censor… um coitado que nem pensar sabia!

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