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Segunda-feira, Dezembro 29, 2025

11. Quando a doença nos obriga a escolher.

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A luta de todos os dias
Há batalhas que não se veem, mas que se travam em cada decisão do dia. Esta é a minha história de quem aprende a viver entre o que deseja e o que pode.

Uma realidade invisível
Há semanas que pesam mais do que outras. Semanas em que o cansaço não é apenas físico, em que a vontade de fazer as coisas parece evaporar-se, em que até sair da cama se torna uma conquista silenciosa que ninguém aplaude. Para mim, como para tantos portugueses que enfrentam tratamentos médicos prolongados, esta é a realidade invisível de cada dia.
Tendo de escolher entre abraçar os meus irmãos no Natal ou proteger a minha saúde. Entre voltar à casa onde nasci, onde a memória da minha mãe que já partiu ainda habita em cada canto, ou ficar em casa porque um deles está com gripe, uma simples gripe que, para mim, pode significar o colapso de todo o meu tratamento.
Eu posso comer o que quiser, graças a Deus tenho tudo que é essencial em casa. Mas se como, sofro.” Esta é minha realidade quotidiana, o dilema de viver limitado por uma condição de saúde exigente. Não é falta de recursos. Não é falta de opções. É a cruel matemática de ter de pesar constantemente cada decisão, cada gesto, cada desejo simples contra o preço que o meu corpo vai cobrar depois.

A coragem que ninguém vê
Chamamos coragem aos grandes gestos, aos momentos heroicos que merecem manchetes. Mas há uma coragem silenciosa, diária, que raramente reconhecemos: a de quem acorda todos os dias sabendo que terá de abdicar, limitar-se, calcular riscos onde outros simplesmente vivem.
É a coragem de dizer “não posso ir” quando o meu coração grita “preciso de estar lá”. É a força de aceitar que, para mim, uma gripe não é apenas uma gripe, é uma ameaça real ao equilíbrio frágil que tanto custou a construir.

O peso invisível das decisões
Vivemos numa sociedade que celebra a autonomia, a liberdade de escolha, o “poder fazer tudo”. Mas eu questiono-me constantemente: qual é o fardo de ter tudo ao alcance da mão e, mesmo assim, não poder simplesmente escolher?
Será fraqueza minha sentir-me esgotado por isto? Não é desistência questionar-me se o cansaço vem do tratamento, das emoções ou de ambos entrelaçados num nó que parece impossível de desatar. É humano. É real.

A solidão de quem decide sozinho
Por detrás de cada ausência minha num jantar de família, de cada convite que recuso, de cada “desculpa, não posso, a tomar decisões difíceis, A pesar prós e contras que os outros nem imaginam. A carregar a culpa de desiludir quem amo, mesmo sabendo que estou a fazer a escolha certa para mim.

A mensagem que precisava de ouvir
Se está a ler isto e se reconhece em minha história, saiba que não está sozinho. O seu cansaço não é fraqueza. A sua necessidade de se proteger não é egoísmo. As suas limitações não diminuem o seu valor nem a sua coragem.
E se conhece alguém que vive assim, talvez hoje seja o dia de lhe dizer: “Eu vejo a tua luta. Eu respeito as tuas escolhas. E estou aqui, mesmo quando não podes estar presente.”
Porque a verdadeira força não está em poder fazer tudo. Está em saber o que posso fazer, aceitar o que não posso, e continuar a lutar todos os dias, mesmo quando ninguém está a ver.
Há batalhas que não fazem barulho. Mas isso não as torna menos reais, menos difíceis, ou menos dignas de serem reconhecidas.

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