Baseado nas crises políticas da Europa que culminaram nas duas Grandes Guerras Mundiais e, posteriormente, com a Guerra Fria, o historiador francês Raoul Girardet (1917 – 2013) publicou o livro “Mitos e Mitologias Políticas”. Esse trabalho resume como ao longo da História, as pessoas vivendo momentos instáveis depositaram esperanças exageradamente optimistas e até mesmo messiânicas em novos políticos e nas suas propostas de governo, formando assim vários tipos de mito. Um desses mitos Girardet deu-lhe o nome de “mito do salvador”.
Raoul Girardet afirmou que o “mito do salvador” representa a figura responsável por salvar o povo em momentos de crise. Girardet, nesse livro (Mitos e Mitologias Políticas de 1987, p. 72 – 73), cita alguns exemplos: Lênin, Mussolini e Hitler, todos possuíam excepcional poder de comunicação, gozavam de imenso carisma, transmitiam sinais de elevada honestidade, dedicação ao povo, inteligência e patriotismo e eram tremendamente admirados e amados pelo seu povo. Alguns desses salvadores se aproveitam dessas fraquezas para conseguir lançar as suas candidaturas como solução final para os problemas da nação. (GIRARDET, 1987, p. 86 – 87).
Um padrão emerge relacionado à necessidade humana de ter esperança em momentos turbulentos, mesmo que essa esperança seja depositada em mentiras, boatos ou narrativas distorcidas. O importante nesses momentos de crise para tais “Heróis” é alimentar a esperança das pessoas, utilizar as suas angústias, os seus medos, mas acima de tudo a sua raiva.
Portugal está atravessando um desses períodos propícios para a emergência de alegados “Salvadores da Pátria”, impulsionado pela disseminação generalizada da corrupção no cenário político e judicial, sem uma solução aparente, e com indicativos crescentes de uma nova crise social e económica à vista.
Recentemente, surgiram figuras disruptivas como António Marinho e Pinto, ex-bastonário da Ordem dos Advogados, e Paulo de Morais, da Frente Cívica. Estes Senhores ousaram denunciar, em várias ocasiões e através de diversos meios de comunicação, a corrupção e a promiscuidade entre os poderes políticos e económicos. Contudo, possivelmente devido à falta de carisma ou à inércia das pessoas em apoiar sempre os mesmos, não conseguiram conquistar seguidores em número suficiente para que seus projectos políticos prosperassem. Marinho e Pinto chegou mesmo a alegar nunca ter tido ilusões sobre possível mudar algo no país.
É certo que, tanto António Marinho e Pinto como Paulo de Morais já passaram de moda, mas mais recentemente surgiu o novo paladino dos portugueses chamado André Ventura com o seu também disruptivo projecto “Chega”. Se prestarmos atenção, esta personagem segue a mesma fórmula que todos os anteriores “Salvadores de Pátrias” ao longo da história seguiram:
-Possuir excepcional poder de comunicação
-Ser persona suficientemente carismática,
-Transmitir sinais de elevada honestidade
-Saber falar com as massas
-Fabricar suas próprias verdades e confundir a opinião pública, sempre apelando à emoção.
-Denunciar em palavras suficientemente agressivas os inimigos do povo.
-Afirmar que a sociedade é dividida entre o povo puro e a elite corrupta mas também que se é político para defender a soberania popular a qualquer custo.
Não admira, assim, que a fé das pessoas depositada em “Salvadores da Pátria” seja tão forte, ao ponto de acreditar cegamente que o seu “herói” está totalmente certo, o que nem é difícil de acontecer atendendo ao miserável estado da política actual, mas muitas das vezes também o seu discurso não passa de pura demagogia, porque não apresenta qualquer tipo de alternativas e as que apresenta poderão ser bem piores para o país. O estado de fanatismo político em que as pessoas se encontram limita-lhes a análise, não conseguem ver os problemas que a jusante poderão surgir, não conseguem perceber que para existir democracia terá de ser o povo a assumir a liderança.
“O grande risco das sociedades é quando aparece o “SALVADOR DA PÁTRIA”, aquele que de um só golpe vai mudar os comportamentos caçando os corruptos e eliminando a corrupção. O mundo conheceu muitos e todos eles foram IMENSOS DESASTRES POLÍTICOS que produziram prejuízos maiores que guerras.”
“Os SALVADORES DA PÁTRIA são trapaceiros que, ao empunhar a campanha moralista, parecem CAVALEIROS DA HONESTIDADE, só eles são puros, todos os demais são corruptos, apontam o dedo santo para quem ousa corrigir-lhes o discurso falso mas convincente e se impõe, aos que percebem seu truque, pela ousadia ameaçadora, o ato teatral é convincente e o farsante assume o papel com convicção, todos tremem de medo.”
“Afinal, quem tem a audácia de se contrapor ao homem puro que quer salvar o País?”
O embuste dos salvadores da pátria; por Motta Araujo
https://jornalggn.com.br/historia/o-embuste-dos-salvadores-da-patria/
Uma frase muito famosa em teoria política, dita por Lord Acton – (historiador britânico, 1834-1902), diz que: “O poder tende a corromper, e o poder absoluto corrompe absolutamente, de modo que os grandes homens são quase sempre homens maus.” Por outras palavras, a pureza de carácter do “Salvador da Pátria” não é inquebrável, ela é facilmente corruptível pois a autoridade política, nas sociedades humanas, em função apenas e tão somente de sua existência, tende a danificar as relações entre seres inicialmente dotados de igualdade.porque o poder político faz de seu detentor uma pessoa diferente das demais cercando-a de símbolos, distinções, privilégios e imunidades que sinalizam sua hierarquia superior.
Fonte: Corrupção política
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