Não gosto do Carnaval. Nunca me mascarei. Para mim será impensável vir a fazê-lo ou a “exigirem-me” que o faça, quando estiver num Lar. Não quero ser o bobo de uma corte que não habito.
Eu não quero fantasiar-me de princesa aos 80 anos, quando na realidade fui plebeia a vida inteira e não sonhei ser outra coisa.
É comum vermos os nossos idosos, sobretudo nestes dias, mascarados em desfiles carnavalescos. Surge-me de imediato a dúvida se estão todos ali por gostarem muito do Carnaval ou se vão, independentemente da sua real vontade, a cumprirem o estabelecido no Plano Anual de Atividades da instituição.
Sei que pode ser lúdico e que a alegria é um estado emocional que devemos proporcionar e alimentar em todos os indivíduos, mas a verdade é que essa atitude tem que vir também de dentro, não chega só o que recebe do exterior. É preciso resiliência, em determinadas fases da vida, menos boas, mantermos o sorriso e a alegria.
Neste caso, penso e por mim falo, tem que fazer parte da história cultural e pessoal de cada um. O respeito à dignidade é fundamental.
Não me parece que a minha mãe que nunca gostou de Carnaval, agora aos 80 anos e se estivesse num Lar ou associação, fosse participar num desfile, pelas ruas da cidade. Nunca seria a sua vontade.
Na minha opinião compete aos filhos impedir um comportamento que se tornou hábito nos lares; massificação dos costumes e padronização emocional.
Eu não quero que um dia me passeiem mascarada numa qualquer rua da cidade se não foi da minha inteira vontade. Mas levanto uma questão que me parece pertinente; e se a minha saúde mental estiver comprometida e eu não puder ter opinião, vou sair em cortejo carnavalesco?!
Fica a no ar esta questão.
E num destes dias passei por um destes desfiles e falando com algumas pessoas adivinhei-lhes uma tristeza silenciosa, um inconformismo que me doeu e que em nada condiz com o Carnaval. A folia também é um estado de alma, ou se está ou não.
Não quero dizer com isto que a velhice tem que ser triste ou deprimente, não. Quero dizer tão somente que a dignidade é um direito a respeitar.
São estas as contradições da vida. A mesma vida que põe a nu, tantas vezes o ridículo de sermos considerados um rebanho.
E vem tudo isto a propósito do que vejo nas nossas instituições: lares, juntas de freguesias e/ou outras associações que acolhem os nossos idosos.
Bem sei que a sociedade está em processo de envelhecimento e que continuará a ser necessário uma reorganização da mesma e o empenho de todos, repondo a honorabilidade – às vezes pouco levada a sério, como forma de defesa dos direitos usurpados a quem deu tudo.
É essencial investir na família enquanto pilar primeiro e nas instituições, no fundo, amparar os nossos idosos e proporcionar-lhes o direito à vida e bem-estar, aos afetos e amor que deverão ser imutáveis.
Não quero ver um esgar dorido e perdido entre confetes e lantejoulas ao ritmo do ruído ensurdecedor dos bombos.
Acredito, contudo, nas instituições e no seu papel social e cultural e sobretudo humano, numa sociedade mais justa e equitativa.1A velhice não é um carnaval e a sensatez é urgente. Os nossos pais e avós não são para exibir no Carnaval, salvo se gostarem e o quiserem, claro!
É caso para dizer: “Não me obriguem a vir para a rua gritar…” a minha indignação.
Ainda bem que o Carnaval são só três dias!
Professora e Escritora