No contexto da apresentação do Orçamento de Estado para 2024, a Senhora Ministra da Justiça anunciou recentemente a realização de obras no próximo ano em todos os centros educativos dependentes do seu Ministério, acrescentando tratar-se de «uma área que tem estado muito esquecida» (RTP Notícias, 11 de Outubro de 2023).
Ao referir esse «esquecimento» quanto à reparação e conservação das instalações dos centros educativos, a Senhora Ministra limita-se a confirmar a realidade degradada para a qual a qual a Comissão de Acompanhamento e Fiscalização dos Centros Educativos (CAFCE) tem alertado sucessivamente nos seus últimos relatórios para a Assembleia da República, incluindo o mais recente (2023).
Mas constitui desassombro e coragem admitir esse «esquecimento» quando integra, há cerca de 18 meses, um governo de um partido político no poder há quase 8 anos consecutivos, governo que, nos últimos dois anos, se tem mostrado publicamente muito preocupado com o aumento da delinquência juvenil, em particular com as suas formas mais graves, e empenhado em encontrar formas de o combater.
Estas preocupações contrastam com o reconhecido «esquecimento» a que os centros educativos têm estado votados, uma vez que eles são precisamente as instituições da Justiça destinadas por lei ao cumprimento da medida mais grave que os tribunais podem aplicar a adolescentes de mais de 12 e menos de 16 anos, que tenham praticado um facto considerado crime pela lei penal: o internamento em centro educativo.
Estes estabelecimentos têm por missão educar os jovens infractores para os valores da vida em sociedade, necessidade cujo grau é em parte determinado pelas circunstâncias e gravidade do acto que levou à intervenção do tribunal. Essa necessidade também influencia a escolha do regime de internamento que pode ser aberto, semiaberto ou fechado, estando este reservado para necessidades educativas reveladas na prática de infracções de maior gravidade. Qualquer dos regimes comporta limitações consideráveis para a liberdade dos jovens que são mais acentuadas no internamento em regime fechado, como a sua designação desde logo deixa presumir.
Embora sejam, na actualidade, estabelecimentos de pequena dimensão e para uma população a condizer, os centros educativos estão sujeitos a um desgaste contínuo e persistente das suas instalações, como acontece em qualquer estabelecimento de educação de jovens, mas que no seu caso pode ser mais sensível por se tratar de instituições constrangedoras da liberdade dos adolescentes e onde não estão por sua livre vontade.
Contrariar esse desgaste obriga os responsáveis a manterem persistente e continuada atenção e diligência relativamente às necessidades de reparação e conservação das instalações para que os centros educativos possam funcionar como espaços atractivos de educação para os valores jurídico-sociais, conforme a lei determina, e constituam um espaço adequado para um tempo que se quer de mudança de comportamentos, em vez de os deixar tornarem-se degradadas pequenas prisões para os mais pequenos que aí se limitem a esperar que o tempo passe depressa.
É prudente que se retirem ensinamentos da já longa história da justiça das crianças e dos jovens em Portugal, onde estabelecimentos equivalentes aos centros educativos desde cedo existiram sob outras designações, conferidas por ocasião das sucessivas reformas legais.
De facto, encarando o passado, verifica-se que foi sempre o estado de degradação a que se deixou chegar as instalações e os meios operativos desses outros estabelecimentos que causou o seu mau funcionamento, o que esteve na origem de um alarme nos meios jurisdicionais e na opinião pública, em grande parte responsável pela emergência de um sentimento, depois generalizado, de inoperância das leis e da necessidade da sua profunda reforma.
Jurista