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Segunda-feira, Maio 12, 2025

José Tolentino Mendonça: O Papa-Poeta “Papabile”- Por José Paulo Santos

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José Tolentino Mendonça é uma figura que se destaca no panorama da Igreja Católica contemporânea, não apenas pela sua posição como cardeal, mas também pela profundidade do seu pensamento e pela sensibilidade com que aborda questões teológicas, culturais e humanas.

Nascido em 1965 na ilha da Madeira, Portugal, José Tolentino de Mendonça é um intelectual multifacetado: poeta, teólogo, biblista e pastor. A sua trajetória reflete uma harmonia rara entre a erudição académica e a proximidade pastoral, características que o tornam uma voz influente na Igreja atual e, para alguns, um possível sucessor do Papa Francisco.

Ordenado sacerdote em 1990, José Tolentino dedicou grande parte da sua vida ao estudo das Escrituras e à reflexão sobre a relação entre fé e cultura. Doutorado em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma, ele é reconhecido como um dos maiores especialistas em exegese bíblica da língua portuguesa. Além disso, a sua formação literária permite-lhe articular a palavra divina com as linguagens da poesia e da arte, criando pontes entre a tradição religiosa e o mundo moderno.

Antes de ser elevado ao Colégio dos Cardeais pelo Papa Francisco em 2019, José Tolentino desempenhou importantes funções na Igreja, incluindo a de Vice-Reitor da Universidade Católica Portuguesa e Arquivista e Bibliotecário da Santa Sé. Esta última posição, assumida em 2018, colocou-o no coração da administração vaticana, onde demonstrou competência e discrição, qualidades que lhe renderam admiração dentro e fora da Igreja.

Numa entrevista à revista Vida Nova, pouco depois de ser elevado ao cardinalato, ele falou sobre a sua surpresa e humildade perante a nomeação:
Nunca me imaginei nesta posição. Acho que sou apenas um homem que tenta seguir Cristo, buscando viver a minha vocação com autenticidade. O que posso oferecer à Igreja? Apenas o meu silêncio, a minha escuta e a minha disponibilidade para servir.”

A obra de José Tolentino Mendonça é marcada por uma abordagem que procura humanizar a teologia, tornando-a acessível e relevante para os desafios do nosso tempo. Nos seus escritos, encontramos uma constante preocupação com a misericórdia, a fragilidade humana e a escuta atenta da Palavra de Deus. Ele convida os fiéis a olharem para a Bíblia não como um texto distante, mas como uma fonte viva de inspiração para a vida quotidiana.

Num dos seus livros mais conhecidos, “O Tempo não Pára – Ensaios sobre a Vida Espiritual” (2014), ele reflete sobre o sentido da existência cristã numa era marcada pela pressa e pela superficialidade. Escreve:
“A fé não nos tira da história, mas coloca-nos no coração dela, com todos os nossos medos e esperanças.”
Esta frase sintetiza bem o seu estilo: profundo, mas ao mesmo tempo próximo, capaz de tocar as pessoas nas suas realidades mais íntimas.

Outro exemplo marcante do seu pensamento encontra-se em “A Mística do Instante” (2011), onde explora a importância de viver o presente com plenitude e gratidão. Para Tolentino, a espiritualidade não é uma fuga do mundo, mas uma forma de encontrar Deus nas pequenas coisas e nos momentos aparentemente banais. Ele afirma:
“Deus está escondido nas rugas do tempo, nas pausas da nossa respiração, nos silêncios que habitam entre as palavras.”

Noutra entrevista, desta vez à rádio Renascença, Tolentino abordou a relação entre fé e cultura, explicando como a arte e a literatura podem ajudar as pessoas a encontrarem Deus no quotidiano:
“A beleza salva o mundo porque nos ensina a ver. Quando paramos para contemplar uma obra de arte, uma paisagem ou até mesmo o rosto de alguém, estamos a abrir janelas para o transcendente. Deus fala através destes sinais, e cabe a nós aprendermos a ouvi-Lo.”

Um dos temas centrais na reflexão de José Tolentino é a fragilidade humana. Em diversas ocasiões, ele sublinhou a importância de aceitar as nossas limitações como parte do caminho espiritual. Numa entrevista ao jornal Público, em 2020, durante o período mais difícil da pandemia de COVID-19, ele partilhou esta reflexão tocante:
“Estamos habituados a pensar que somos invulneráveis, mas a vida constantemente nos lembra que somos frágeis. E isso não é uma fraqueza, é uma oportunidade. Na nossa vulnerabilidade, encontramos espaço para Deus, para os outros e para nós mesmos.”

Essas palavras soaram como um bálsamo numa época de incerteza e medo, recordando às pessoas que a fé não elimina as dificuldades, mas dá força para enfrentá-las com dignidade.

José Tolentino compartilha com o Papa Francisco uma visão pastoral centrada na misericórdia e na atenção aos marginalizados. Ambos enfatizam a necessidade de uma Igreja “em saída“, que vá ao encontro das pessoas onde elas estão, sem julgamentos nem preconceitos. Essa afinidade foi reforçada quando o papa argentino o escolheu para pregar os exercícios espirituais da Quaresma ao Colégio dos Cardeais e à Cúria Romana em 2018. Durante esses dias de retiro, Tolentino falou sobre a importância da escuta, da contemplação e da coragem de enfrentar os desafios da Igreja com humildade e criatividade.

Num desses momentos, ele disse algo que ecoa profundamente na mensagem franciscana:
“Não podemos anunciar um Deus vivo se nós mesmos não estamos vivos. A nossa missão começa quando aprendemos a ser mensageiros da alegria, mesmo nas circunstâncias mais adversas.”

Quando questionado sobre os desafios futuros da Igreja, Tolentino mostrou-se otimista, apesar das dificuldades. Num artigo publicado no Expresso, em 2021, ele afirmou:
“A Igreja não pode ter medo de mudar. Mudar não significa abandonar a sua identidade, mas antes renová-la para responder aos novos tempos. Temos de ser uma Igreja que acolhe, que dialoga, que testemunha a misericórdia de Deus em cada gesto.”

Um Possível Sucessor?

Embora seja especulação considerá-lo um candidato ao papado, José Tolentino Mendonça possui qualidades que o tornam uma figura respeitada no Vaticano e além. A sua capacidade de comunicar a fé de maneira simples e poética, aliada ao seu compromisso com os valores do Evangelho, faz dele um líder potencialmente capaz de continuar o legado de Francisco. No entanto, ele próprio sempre evitou qualquer ambição pessoal, preferindo colocar-se a serviço da Igreja com humildade e dedicação.

Como ele próprio disse numa entrevista à RTP, em 2018:
“O Evangelho não é uma teoria, mas uma prática. É a arte de amar, de cuidar, de reconstruir. E isso exige de nós coragem, paciência e, sobretudo, coração.”

José Tolentino Mendonça é, antes de tudo, um homem de Deus profundamente enraizado na cultura e na espiritualidade do nosso tempo. As suas palavras e obras são um convite constante à reflexão, à oração e à ação. Seja como cardeal, como teólogo ou como poeta, ele lembra-nos que a presença de Deus pode ser encontrada nas páginas da Bíblia, nas ruas das cidades e nos gestos de ternura que partilhamos uns com os outros. Como ele escreveu:
“A verdadeira sabedoria não está em possuir todas as respostas, mas em saber fazer as perguntas certas.”

Neste sentido, José Tolentino Mendonça continua a iluminar o caminho de muitos, mostrando que a fé não é uma resposta pronta, mas um caminho a ser percorrido com coragem e amor.

Um “Papa-Poeta-Papabile” de Portugal para o Vaticano? Talvez. Mas, acima de tudo, um pastor que sabe ouvir e amar, em Poesia.

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