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Domingo, Outubro 13, 2024

O jazz está vivo – “14º Festival Porta Jazz” com muitos e bons intérpretes

A “Associação Porta-Jazz” é uma associação sem fins lucrativos, gerida por músicos, que se formou com o intuito de promover o Jazz no Porto, tendo como principal objetivo de incrementar e encorajar o desenvolvimento de projetos originais e criativos, de forma a garantir uma cada vez mais crescente qualidade artística das atividades desta área no Porto. A Porta Jazz existe há dez anos e já realizou mais de mil concertos. É também um espaço de residência permanente que permitiu à associação tornar-se um núcleo de confluência de músicos e público.

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António Ferro
António Ferro
Músico/Colaborador

O 14º Festival da Porta Jazz, desenrolou-se no Teatro Municipal Rivoli, entre os dias 02 e 04 de fevereiro de 2024.

Programa
02 de fevereiro – Alma Tree “Sonic Alchemy Suprema” Featuring Alves, Moses, Trilla. Axes “Hexagon”
03 de fevereiro – Ward/Trocado/Tavares “Corrosion”, How Noisy Are The Rooms?, Ducret/Mokuñas/Blaser Trio, Porta-Jazz/Robalo+Hans Koller,
04 de fevereiro – Mané Fernandes “Matriz_Motriz”, Themandus, Tom Brunt’s Acoustic Space, Luís Ribeiro “A Invenção da Ficção”, Nuno Campos 4TET “Something to Believe In” e Ensemble Mutante #1 – Vera Morais

Concertos.
O cidadão esteve presente nos concertos dos dias 03 e 04 de fevereiro
e “ouveu”…

Dia 03 de fevereiro – o Decateto Porta Jazz, é uma parceria com a Associação Robalo Music. Nascida em 2016 como editora independente, organiza o programa pedagógico – Atelier dos Sons – destinado precisamente a crianças dos 7 aos 12 anos. À parte disso tem também aproveitado a passagem de músicos internacionais por Portugal para organizar masterclasses e workshops.

No início fiquei surpreso pela inusitada e atípica formação de sopros (2 sax tenores, 2 sax altos e 2 trompetes), acompanhados pela clássica secção rítmica de guitarra, piano, contrabaixo e bateria (Count Basie).
Embora tenha estranhado inicialmente a falta de um trombone, certo é que rapidamente fui conquistado pela sonoridade e também pelo “rendilhado” de pergunta/resposta contrapontística… No segundo tema da noite, um blues “encapotado” fiquei surpreso pelos solos do saxofonista alto João Paulo Silva (pela a facilidade da utilização dos graves) e pelo trompetista João Almeida. O terceiro tema trouxe ao palco a voz de Joana Raquel que muito comodamente foi interagindo com frases dos sopros em uníssono. Ao quarto tema, chega a vez, do guitarrista Eurico Costa, fazer ouvir a sua elegante voz instrumental, num tema rápido e irrequieto. Mais uma vez os saxofones se impõe, e eu digo a alguém ao meu lado:
– Isto é Parker! No final do tema acertei, o tema era um tributo a Charlie Parker!
A voz à “capela”, convida o piano de Hans Koller, que desde o início dirigiu o decateto (maestro), para se juntar e os acordes tornam-se suntuosos, alguns absortos ou até acintosos… INTERVALO!

Na segunda parte do concerto, ficamos com o saxofonista cubano Henry Paz “River Creatures”, featuring Nate Wooley (trompete) & Tom Rainey (bateria).
É a primeira vez que assisto a um concerto com este tipo de formação. O baterista usou umas baquetas muito finas e tem uma segurança, uma capacidade de interação extraordinárias, no meu ver, o melhor músico em palco. O trompetista Nate Wooley, usou sonoridades da trompete, perfeitamente surpreendentes, inusuais e inovadoras, pelo
menos para mim…
Curiosamente o líder, o saxofonista Hery Paz, foi quem menos me entreviu e vislumbrou…

Dia 04 de fevereiro – Nuno Campos 4to
A sonoridade conseguida, entre algumas linhas de baixo e a mão esquerda do pianista criaram um timbre esplendoroso de se ouvir. A apresentação do seu último trabalho “Something to Believe In”, trouxe os fantásticos músicos: José Pedro Coelho – Saxofone tenor, Miguel Meirinhos – Piano e Ricardo Coelho – Bateria.
Este trabalho, instigado e influído na mitologia egípcia, após uma visita ao Cairo, para a participação num festival anual. Sem nos esquecermos da defluência dos compositores Messiaen e Bartok. Descobri outra sonoridade fantástica! Um contrabaixo com arco e um saxofone tenor, brilhante! Bem falar do pianista Miguel Meirinhos, é falar simplesmente de um “génio”, não existe outra palavra para o definir. O Miguel não é apenas um pianista, mas sim, um “outro” pianista…Quando Monk, apareceu pela primeira vez ao público, inicialmente alguns músicos chalacearam e motejaram dele…- Não sabe tocar piano…E vejam só o resultado…Um filme se realizou, baseada na sua eterna balada “Round About Midnight”, com uma interpretação insigne e excelso do saxofonista Dexter Gordon, filme dirigido por Bertrand Tavernier, “À Volta da Meia Noite”. Mas voltemos à música!
O contrabaixo improvisa, sobre um ostinato do piano ao qual se junta o saxofone tenor de José Pedro Coelho. Se me perguntarem, como poderia adjetivar esta música (?), diria: mutável, conivência, cúmplice, ancha, vultuosa,… Depois de uma sonoridade onde Coelho, explora e muito bem, o timbre das chaves do saxofone, a música cresce com ele
ao leme. É ele que coage, impele e compulsa, o restante grupo a crescer também e um final inopinado e abrupto nos espera. Numa situação de “orgasmo sonoro”, duas colcheias secas em uníssono, terminam o concerto. INTERVALO!

Mas o melhor ainda estava para vir! A Vera Morais, conseguiu abismar o “recordista” europeu de festivais de jazz e blues, pois já programei e realizei sessenta e quatro. Imaginem só, quantos músicos de primeiro plano, não atuaram nos meus festivais…(Ferro! Não te entusiasmes…)
Ensemble Mutante #1
Em palco. À esquerda, João Pedro Brandão na flauta, no meio Vera Morais na voz e do lado direito Hristo Goleminov no clarinete baixo.
Mas os instrumentos ficaram em silêncio, para se ouvirem as vozes a postergarem-se em linguagens impercebíveis…Depois surgem outros sons ? De onde vêm ? Piano? Vibrafone? Bateria? Depois sobe a cortina e aí já não tinha qualquer dúvida em saber que este espetáculo, foi cogitado e reflexionado por uma mulher – Vera Morais!
Vibrafone com arco? Outro espavento!…Depois começo a ouvir passarinhos… Passarinhos? A pianista Inês Lopes a tocar piano com meias luvas e com aquele brinquedo que enches com água e imita os sons dos pássaros! Entretanto a voz reinventa-se à procura de novos
sons e o sax alto não resiste e junta-se à paleta de sons! O Vibrafone espraia-se, os sopros encadeiam-se com a finalidade de nos voltarem a surpreender com diferentes harmonias, diferentes timbres, diferentes sonoridades… O clímax aproxima-se, como se de um bom orgasmo se tratasse e o volume sonoro intensifica-se. Estamos a aproximar-nos dos terrenos do “Free Jazz” que eu também e tão bem conheço, estou a referir-me ao bom, ao lídimo, como: Sun Ra, Art Ensemble ofChicago, Anthony Braxton, Cecil Taylor, Charles Gayle (trouxe-o ao Matosinhos em Jazz) e ao seu fundador – Ornette Coleman. Tive a sorte de os “ouver” a todos! A Inês Lopes ataca o piano na veleidade e devaneio, com “clasters” e cotoveladas…E a grande mentora do projeto que nunca deixou o seu crédito por mãos alheias, começa a repetir uma frase que eu entendi como: – Ainda não é o fim do princípio do fim do mundo…Mas foi mesmo o fim do concerto. Participaram neste
concerto de encerramento: Vera Morais – Voz, João Pedro Brandão – Flauta, Saxofone alto, Hristo Goleminov – Clarinete baixo e Saxofone tenor, Inês Lopes – Piano e Toy piano, Aleksander Sever – Vibrafone e Marco Luparia – Bateria e percussão.

Jam Sessions
No dia 03 de fevereiro, dia do meu aniversário tive direito a uma interpretação peculiar do “Happy Birthday” e até subi ao palco para tocar um blues no contrabaixo e umas bossas-novas na guitarra. Fiquei deveras surpreendido com os excelentes músicos que tive a oportunidade de conhecer, principalmente o grupo do curso do Conservatório de Música do Porto. Os teclistas substituíram tão bem o contrabaixo com a mão esquerda que me conseguiram emaranhar…
Quando conheci o filho do Carlos Azevedo ele tocava violoncelo, ainda bem que o trocou pelo contrabaixo… Foi muito gratificante ter estado com o Luís Hilário e o Carlos Martins. No ano de 1983, eu e o Carlos gravámos juntos o primeiro disco da Maria João, juntamente com o Mário Laginha e o Carlos Vieira. Eu até compus uma balada para ele
“Snitram”, penso que nunca a tocou ao vivo…
Parabéns Porta Jazz! Parabéns Robalo! Por não deixarem amainar declinar, aquela música que o meu amigo Duarte Mendonça, apelidava: O Jazz é a Melhor Música do Mundo!

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